Conteúdos e materiais
O tema suicídio é um grande tabu em nossa sociedade. Por muitos e muitos anos, se pensou, inclusive, que falar sobre o assunto era um risco porque poderia incentivar que novos casos acontecessem. Com isso, um véu de medo, preconceito e desinformação tomou conta do cenário e de tudo que envolve o tema. Só em 2015, com a criação da campanha de conscientização chamada Setembro Amarelo – liderada pelo Centro de Valorização da Vida (CVV) em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria -, o assunto passou a ser mais discutido e encarado com o devido cuidado que merece.
A Organização Mundial da Saúde estima que, no mundo, mais de 700.000 pessoas morrem por suicídio a cada ano. De acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU), entre os jovens de 15 a 29 anos, o suicídio aparece como a quarta causa de morte mais recorrente. Os números são mesmo alarmantes, ou seja, não adianta fingir que o problema não existe. E, sim, falar é educar, é prevenir, dizem os especialistas.
A discussão avançou e agora o ponto central é: falar é importante, mas como, exatamente, é a melhor forma de se falar sobre o assunto? Nas escolas, por exemplo, qual a melhor forma de abordar a temática do suicídio?
Para Dayse Miranda, socióloga, doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e Presidente do Instituto de Pesquisa, Prevenção e Estudos em Suicídio (IPPES), é fundamental trabalharmos as habilidades socioemocionais das crianças e jovens. “Falar é sempre importante porque leva informação à sociedade e diminui o tabu. A campanha Setembro Amarelo fez a temática chegar às pessoas, o que foi muito, muito bom. Mas precisamos também ser cuidadosos com esse falar, como falar, como abordar. E o que as pesquisas no Brasil e no mundo mostram sobre isso é que precisamos trabalhar com a prevenção, abordando as questões socioemocionais que envolvem a pessoa. Falar em saúde mental como algo rotineiro em nossas vidas é o melhor caminho para a prevenção ao suicídio. Dessa forma, botamos o foco na qualidade de vida, na saúde mental, no acolhimento e não na palavra suicídio. Falar em prevenção é valorizar a promoção da saúde mental e da qualidade de vida. Nesse sentido, evitamos usar a palavra suicídio e falamos em prevenção das violências autoprovocadas”, explica Dayse.
A psicóloga escolar Fernanda Bertollini, do Colégio Araújo Rocha, na zona norte do Rio, também aponta o desenvolvimento das habilidades socioemocionais como o melhor caminho a ser trilhado. “Trabalhamos desde cedo com nossos alunos a parte socioemocional deles através de um programa chamado LIV, que promove na rotina de atividades um momento específico para se falar sobre sentimentos, emoções, resolução de conflitos. São demandas e temáticas levadas por eles próprios, o que é muito bacana. E na medida em que ficam mais velhos, a abordagem desses temas vai ficando mais aprofundada. É sempre um momento muito bacana de troca, diálogo e aprendizado para os alunos e a escola. Sem falar que isso aproxima a gestão escolar do aluno, estreita vínculos. Acreditamos que essa é a melhor forma de prevenção porque naturaliza nesse aluno a importância de se falar sobre seus sentimentos. E ajuda também a que todos enxerguem melhor os sinais de quando alguém não está bem, está mais isolado, mais calado ou com eventuais problemas. Enfim, é uma boa ferramenta para lidarmos com essa temática”, afirma Fernanda.
Já a psicóloga Nathalia Troise comentou: “Falar, sim, mas é importante sempre abordar de uma forma preventiva e não especulativa ou sensacionalista. Esse é o caminho. Os estudos recentes sobre o tema apontam para a educação socioemocional. Falar sobre maturidade emocional, sobre como expressar suas emoções, sobre como identificar, acolher. Escolas, empresas ou mesmo o núcleo familiar têm que entender que falar sobre as emoções é a melhor forma de prevenção. Valorizar a vida, a saúde mental, as boas trocas e o acolhimento, quando necessário”.
Escola e família devem ser parceiras nessa jornada
E, como bem definiu Fernanda: “Setembro Amarelo ajudou a descortinar o tabu que encobria o tema do suicídio, mas é fundamental que saibamos enxergar e trabalhar a saúde mental, as habilidades socioemocionais de nossas crianças, jovens e adultos, sempre. O ano todo. Esse é o caminho da prevenção”.
E, claro, na escola, o ideal é que funcionários e professores sejam minimamente preparados para lidar com o tema. Capacitar com workshops, seminários, rodas de conversa são boas práticas a serem desenvolvidas. Assim, a equipe se fortalece emocionalmente e também fica mais atenta aos possíveis sinais de alunos com ideação suicida e/ou problemas que mereçam um acompanhamento mais de perto.
Dayse e os pesquisadores do IPPES desenvolveram um programa chamado “Escola Que Previne (https://ippesbrasil.com.br/escolaqprevine/), que tem como objetivo desenvolver habilidades emocionais para a vida de professores, funcionários e alunos, além de formar multiplicadores em Prevenção de Violências Autoprovocadas em Ambiente Escolar.
Segundo ela, essa rede de apoio e de informação é necessária e muito bem-vinda no trabalho de prevenção: “Como sempre, informação é o que faz a diferença. Na escola, uma equipe preparada, capacitada. Em casa, uma família aberta ao diálogo. Essa escuta, esse acolhimento sem julgamentos é importantíssimo. E uma parceria entre escola e família. Juntas, podem trabalhar melhor quando notarem um caso potencial. E claro: buscar ajuda especializada quando julgarem necessário”.
Fatores de risco
Para as especialistas ouvidas pelo blog da Villas Boas Seguros para essa matéria, alguns fatores de risco na idade escolar são o bullying, o cyberbullying, o isolamento, o sentimento de não pertencimento, a descoberta da sexualidade/da homossexualidade, pressão com o vestibular e com a escolha da carreira etc
“A adolescência é uma fase de muitos altos e baixos emocionais. É preciso olhar atento, escuta ativa e acolhimento, seja em casa ou nas escolas”, afirma Dayse.
Por Dani Maia
Como falar de suicídio nas escolas?